por Renata Falzoni
Ainda que alguns ciclistas torçam o nariz para ciclomotores e bikes elétricas, eles podem ser uma alternativa nas cidades para tirar carros das ruas
Cidades sustentáveis e acessíveis não dependem de carros para funcionar. Elas oferecem estruturas para a livre escolha, cada um vai como quer, sendo prioridade os modos ativos combinados ao transporte coletivo. Nessa jornada disruptiva da lógica do século 20, que priorizou veículos motorizados individuais e detonou as cidades mundo afora, o maior desafio é: como desestimular o uso do automóvel?
Por mais que a população faça a sua parte, demande ciclovias, calçadas e transporte coletivo de qualidade, é enorme a lacuna entre a vontade politica e as melhores soluções para uma cidade. O que entre aspas “ajuda” é a tecnologia que atropela essa lerdeza insustentável do poder executivo. Recentemente uma profusão de veículos elétricos surgiu no mercado, todos eles eficientes, mas hoje disputam o espaço daqueles que se movem a pé ou de bicicleta.
Esses artefatos de fato tiram motoristas de carros, mas locomovem-se em uma velocidade que conflita com a escala humana, então fica a pergunta: Qual a solução? O primeiro passo já foi dado na resolução 996 de 15 de junho de 2023 do Contran, que normatiza estes veículos e em resumo descreve:
Bikes elétricas, tem que pedalar para o motor ajudar, vão até 32km/h, até mil watts de potência, acelerador de assistência até 6km/h, ficam equiparadas às bikes convencionais e podem usar ciclovias.
Equipamento individual autopropelido, com acelerador, vão até 32km/h, até mil watts de potência, medida entre os eixos até 130cm e podem usar ciclovias. Aqui estão patinetes, monociclos elétricos, skate elétricos e “bicicletas elétricas” com acelerador.
Ciclomotores (passageiro montado) e motonetas (passageiro sentado), com acelerador, velocidade até 50km/h, potência máxima de 4mil watts e o entre eixo maior que 130cm. Estes veículos precisam placas e requerem categoria A na CNH, ou autorização ACC e não podem rodar na ciclovia.
Agora falta o segundo passo que é a regulamentação municipal.
Repito, estes veículos tiram carros das ruas, mas a disputa por espaço acirrou. Por omissão de prefeituras como aqui em São Paulo, todos que não carros ou motos, refugiam-se em ciclovias, até os pedestres. Conclusão, o ambiente que deveria ser de proteção aos que vão de bicicleta, está ainda mais inseguro, numa disputa desigual, com veículos velozes e pesados, pilotados por cidadãos que saíram de automóveis, mas trouxeram consigo o acelerador e a mentalidade de intimidar a pessoa ao lado, usando seu carro como arma.
Educação é importante, mas não é tudo. Falta a normatização e fiscalização de uso nas ciclovias pelas prefeituras, velocidade máxima permitida ser bem menor que 32 km/h, mais a necessária inclusão destes veículos nas ruas da cidade.
O correto, até pelo artigo 9 da resolução do Contram, é adaptar as avenidas da cidade para que a velocidade máxima na pista da direita não exceda 40 km/h e com isso retomar um trabalho de acalmamento de trânsito que, no caso de São Paulo, foi abandonado por uma opção política. Com isso motonetas e ciclomotores poderiam circular pelas ruas da cidade e ajudar no processo de educação cidadã pelo compartilhamento de vias.
Reduzir a velocidade máxima nas ruas além de salvar vidas, melhora a fluidez dos veículos, pois aumenta a velocidade média do sistema. Assim, mais e mais motoristas seriam atraídos a deixar seus carros em casa e moverem-se de forma mais eficiente pela cidade. O que falta além de visão e vontade política? Inteligência de nossos gestores.
Sobre a autora: a cicloativista Renata Falzoni é jornalista e arquiteta e há mais de 40 anos trocou o carro pela bicicleta como seu principal meio de transporte. Fundou o primeiro grupo de ‘pedal nortuno’ de São Paulo, teve programas na ESPN Brasil e Gazeta. Há 10 anos criou e produz o canal Bike é Legal.
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